segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Retratos de uma despedida

A morte da mãe significou bem mais do que a dor da perda para  Philip. A súbita ausência da principal cuidadora do pai descortinou o que ela havia tentado esconder do filho único, para poupa-lo. Doente, o pai de Philip desenvolveu um tipo de demência que o impedia de guardar memórias recentes.
A prova derradeira veio durante uma visita ao hopital onde sua mãe ficou em coma por 4 dias após um aneurisma cerebral. Na saída, o pai questionou o Philip: "Onde está sua mãe?", esqueceu completamente
tê-la visto pouco antes. Não registrou nem mesmo o dia do funeral da esposa. Em casa, após a cerimônia, perguntava por sua mulher a cada 15 minutos, e era repetidamente informado que ela havia morrido.
Reagia sempre como se estivesse sob o impacto do choque inicial: "Por que ninguém me disse? Por que você não me levou ao enterro? Por que eu não a visitei no hospital?"
Para poupar ele próprio e o pai do diálogo torturante, Philip inventou que a mãe havia ido a Paris cuidar de um irmão doente. Iniciava-se ali uma nova fase, com uma inversão de papéis muito comum a partir de certo ponto da vida. philip teve que se responsabilizar pela vida de seu pai noite e dia.
Esse período durou três anos, vividos quase em sua maioria dentro de um apartamento do Upper East Side, em Nova York. Durante esse tempo foram presenciadas dificuldades e sofrimento impostos pela doença e também nas situações em que o silêncio ou as risadas permitiam acreditar em uma breve sensação de normalidade. Philip se deu conta de que havia muitas coisas das quais ele queria se lembrar.
Gostaria de se lembrar dos momentos em que ele parecia aquele homem de outros tempos, que dava conselhos sobre a vida profissional, falava sobre a importância da familia, ria e fazia brincadeiras.
Gostaria também de apagar alguns instantes dilacerantes, quando o ouvia dizer que preferia estar morto. Quando philip sentia seu coração partido vendo a tristeza, a solidão, e a saudade que seu pai sentia da companheira de outrora. Ainda que ambos se amassem, também sentiam que aquilo não era uma vida para ser vivida, esperando a morte em uma espécie de limbo.
Era um peso grande demais para se carregar. Philip não tinha irmãos para ajuda-lo ou para lamentar a morte de sua mãe ao seu lado. Mas ele se deu pro conta de que seus pais cuidaram dele quando era incapaz de fazer isso por conta própria, então o mínimo que poderia fazer era retribuir o favor.
Ele recordava algumas noites em que era extremamente doloroso fingir que sua mãe estava viva, se lembrava das vezes em que se trancava no banheiro e chorava porque o fardo já lhe era pesado demais. Mas sabia também que toda aquela fantasia fazia seu pai feliz e tornava sua vida mais suportável, via, então, que o sacrifício era válido.
Aproveitou-se de todo tempo que dispusera para estar na presença de seu pai, permitindo-lhe saber o quanto era amado. Percebeu que as pessoas podem morrer amnhã. Esse é nosso "lugar comum". Essa é a sina a qual todo ser está atrelado.
"Passei a noite toda com ele, segurando-lhe a mão, ouvindo a sua respiração, pensando quando seria a última. Ele morreu na sua cama, comigo ao seu lado. Durante os últimos 3 anos estive à espera. Aterrorizado com a possibilidade de que ele morresse quando eu estivesse longe."

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